GALILEU
GALILEI
Parece-me
também perceber em Sarsi sólida crença que, para filosofar, seja
necessário apoiar-se nas opiniões de algum célebre autor, de tal
forma que o raciocínio, quando não concordasse com as demonstrações
de outro, tivesse que permanecer estéril e infecundo. Talvez
considere a filosofia como um livro e fantasia de um homem, como a
Ilíada e Orlando Furioso,
livros em que a coisa menos importante é a verdade daquilo que
apresentam escrito. Sr. Sarsi, a coisa não é assim. A filosofia
encontra-se escrita neste grande livro que continuamente se abre
perante nosso olhos (isto é, o universo), que não se pode
compreender antes de entender a língua e conhecer os caracteres com
os quais está escrito. Ele está escrito em língua matemática, os
caracteres são triângulos, circunferências e outras figuras
geométricas, sem cujos meios é impossível entender humanamente as
palavras; sem eles nós vagamos perdidos dentro de um obscuro
labirinto.
(GALILEU.
O Ensaiador. In: Giordano Bruno/Galileu Galilei/Campanela. São
Paulo: Abril Cultural, 1973. (coleção Os Pensadores). p. 119)
***
Capítulo
VII – A Revolução Científica
Bronowsky
e Mazlish
Quando
Galileu Galilei nasceu, em 1564, ainda não havia um relógio que
marcasse rigorosamente o tempo em terra. Os relógios medievais não
eram construídos para serem instrumentos precisos que trabalhassem
uniformemente no dia a dia. Os relógios medievais eram, em primeiro
lugar, relógios de mosteiro, destinados a dividir o dia de oração
em partes iguais, ou horas canônicas, desde as primeiras, Matinas,
até a tarde, Vésperas, e às últimas, Completas. O dia que era
assim dividido corria essencialmente da alba ao escurecer e era, por
isso, um dia diferente no Verão e no Inverno.
[…]
Galileu não tinha 20 anos quando, como ele conta, reparou na
oscilação regular de uma lâmpada durante um ofício na Catedral de
Pisa, em 1583. Como poderia avaliar a sua regularidade? Galileu pôs
o dedo no pulso e reparou que o pêndulo oscilante e o bater do pulso
mediam o mesmo tempo. Estabeleceu uma uniformidade subjacente na
natureza, segundo a qual muitos relógios trabalharam até hoje: o
movimento uniforme de um pêndulo, que leva virtualmente o mesmo
tempo, quer balance segundo um arco grande quer segundo um pequeno.
Galileu
não foi o primeiro a adivinhar que o pêndulo mede quase um tempo
perfeito: isso já fora previsto por Leonardo, cem anos antes. E
Galileu não provou estritamente a sua descoberta; isso foi feito
matematicamente por Christian Huygens cem anos mais tarde. O que
Galileu fez foi usar o pêndulo. Fez dele provavelmente um
instrumento básico para medir o tempo na experimentação mecânica
e, por esse meio, introduziu o tempo e o relógio na questão prática
de prosseguir experiências na terra.
[…]
Galileu era, assim, capaz de medir a queda de objetos em distâncias
muito pequenas: mais precisamente, mediu o tempo que levavam para
rebolar por uma encosta. Podia provar que, qualquer que fosse a
inclinação, uma bola rola de maneira tal que a distância total
percorrida desde o ponto de repouso é proporcional ao quadrado do
tempo que esteve em movimento. Para contar o tempo desse modo, o
bater de um pêndulo é, evidentemente, ideal. E Galileu provou que a
sua lei é verdadeira qualquer que seja a massa da bola: Aristóteles
era derrotado, por assim dizer de caminho.
[…]
Galileu fizera mais do que comparar a queda de um objeto com a queda
de outro: formulara uma lei precisa que rege a queda, numa forma que
era matematicamente bela e convincente. A sua habilidade prática com
o pêndulo e a sua capacidade matemática para escrever a lei
combinaram-se para dar ao trabalho um acabamento nunca antes
atingido. Galileu juntara perfeitamente a lógica e a experiência.
(BRONOWSKY,
Jacob & Mazlish, Bruce. A tradição intelectual do Ocidente.
Lisboa: Edições 70, 1986. pp. 135s.)
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